A cada ano que passa a polêmica capital paulista, à semelhança de um doente terminal, parece ver sua saúde definhar a olhos vistos e nenhum tratamento prescrito pelos seus “médicos” funcionar.
De fato, observando-se os dados da infraestrutura urbana de São Paulo, o panorama geral é alarmante: congestionamentos crescentes, enchentes mais abundantes e volumosas, qualidade do ar muito abaixo do mínimo recomendável, é uma lista crescente.
Voltando à metáfora da medicina, as medidas adotadas têm se mostrado mais como paliativas do que verdadeiramente estruturantes de uma mudança mais profunda. Muito pelo contrário, há a repetição de fórmulas e práticas ineficientes em longo prazo. Talvez o caso mais sintomático dessa situação seja o do rodízio de veículos, iniciado em São Paulo no final dos anos 90, e que não logra tornar a vida dos cidadãos - motoristas, passageiros, ciclistas ou pedestres – mais tolerável. Perdeu o efeito.
Por mais absurdo que pareça, mesmo com o contínuo enfraquecimento dos efeitos do rodízio municipal, as autoridades insistem em reapresentá-lo como uma das principais “soluções” para as mazelas do trânsito. Nessa nova encarnação, ele seria estendido para dois dias da semana por veículo ou, teríamos ainda, a instituição de pedágio urbano!
Contudo há formas mais eficazes e justas para se mitigar o trânsito até que as medidas mais definitivas sejam implementadas, sendo de se destacar, com certa obviedade, o fortalecimento do transporte público de qualidade.
Não obstante haver bastantes alternativas ao cenário atual a serem discutidas, entendemos que questões relativas os chamados “grandes empreendimentos” pouco têm ocupado espaço na mídia, nas discussões acerca dos seus impactos.
A expansão imobiliária em São Paulo vem gerando diversos mega projetos e empreendimentos tanto em zonas residenciais como em comerciais – como, por exemplo, a Vila Olímpia e parte do Morumbi - cuja ocupação já está manifestamente além de qualquer limite razoável.
Com relação ao Direito aplicável a essa questão, não é de se negar que há louváveis esforços para se tratar dos citados problemas. Como marco, houve, em 2001, a publicação do Estatuto da Cidade, Lei Federal que tentou delinear os princípios e regras estruturantes do Direito Urbanístico. Tal diploma legal contempla diversas disposições que o Poder Público e empreendedores devem obedecer sendo de se destacar, para grandes empreendimentos, o estudo de impacto de vizinhança, definindo o que a legislação específica sobre o assunto deveria conter, como, por exemplo, a necessidade de se abordar a “valorização imobiliária” e “geração de tráfego e demanda por transporte público”.
Muito embora o impacto de vizinhança esteja previsto no Estatuto e noutras leis e regulamentos do Município de São Paulo, o fato é que grassam a olhos vistos empreendimentos imobiliários que, segundo o mais comezinho bom-senso, deveriam ser mais bem estruturados com medidas mitigatórias e compensatórias mais severas, posto que impactem excessivamente as vias de trânsito, a permeabilidade do solo (favorecendo as enchentes), gerando poluição auditiva e visual, dentre diversos outros aspectos deletérios ao meio ambiente urbano.
É que o aquecimento do mercado imobiliário atualmente experimentado gera, naturalmente, pressões de cunho sócio-econômico que podem levar à aprovação de projetos e imóveis irregulares ou, no mínimo, haver o atendimento formal do quanto previsto em lei, não obstante os impactos serem materialmente insuportáveis.
O rigor na fiscalização desse processo é fundamental e separa o joio do trigo, ou seja, valoriza o empreendedor honesto e cioso da função social de sua atividade em detrimento daquele que busca fazer valer seus interesses privados a qualquer custo, mesmo que à burla da legislação vigente e da cooptação de agentes públicos.
O que deve haver, urgentemente, entre os entes diretamente interessados e os Poderes Constituídos é um atual e constante aprofundamento da questão do impacto dos grandes empreendimentos na cidade, seja criando instrumentos novos para tratá-la com mais eficiência, seja aperfeiçoando a interpretação e a implementação dos já existentes.